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Faça as unhas no puerpério



Caetano,


Hoje o assunto é sério.


Faça as unhas no puerpério.


Não. Obviamente não me dirijo a você. Esse foi o título do texto (leia aqui) que recebi do meu obstetra antes da nossa alta, pouco mais de 24 horas depois do seu nascimento. Pouco mais de 24 horas após o meu renascimento.


Não. Não é balela romantizada de mãe deslumbrada essa história de renascimento. É que, quando nasce um filho, nasce também uma mãe. E para isso, é preciso que, de certa forma, morra uma mulher. Isso se chama transformação. Acontece com todo mundo, em maior ou menor escala. Mas acontece. E isso costuma ser doloroso. Porque morrer não é fácil. Renascer muito menos.


É claro que trata-se de uma simbologia, mas resolvi levar o título daquele texto ao pé da letra. Tomei uma decisão. E desde que você nasceu, tenho as unhas feitas.


Ao longo da minha rotina corrida de trabalho, por muitas vezes tive vergonha das minhas unhas. Não havia tido tempo de cuidar delas. Hoje, elas estão sempre feitas. Não impecavelmente feitas, é verdade. Elas estragam mais rápido do que de costume. Mas, por incrível que pareça, nunca mais me envergonhei das minhas unhas. Elas viraram motivo de orgulho para mim. Parece bobagem, não é Caetano? No mínimo futilidade. Orgulho das unhas feitas?!


Mas não é.


E você precisa saber disso, caso um dia esteja ao lado de uma mulher que acaba de se tornar mãe.


Outro dia me perguntaram: "Como fazer para manter as unhas sempre feitas?"


A resposta é simples. Decidi que seria assim.


Também decidi abrir a nossa casa para visitas desde o dia seguinte ao seu nascimento. Essa é uma questão muito pessoal. Mas decidi assim, porque me fazia bem estar cercada das pessoas que eu gosto em um momento tão delicado e potencialmente solitário. Como você também se adaptou, foi assim que seguimos. Recebendo nossos amigos e familiares, de unhas feitas, cabelos limpos e secos dia sim, dia não, short e camisa de botão. As lindas camisolas do enxoval foram ótimas companhias para as longas noites iniciais. E só.


Os brincos não saíram das orelhas. O corretivo também estava sempre no rosto. É certo que não cobria tão bem as olheiras, mas o pó e o batom ajudavam bem. O blush dava aquela arrematada final.


Essa mamãe é foda né? Decide assim e pronto. Simples, não é?


Não!


Colocar em prática deu trabalho. Para o corpo exausto e inchado e mais ainda para a mente perdida, desnorteada. Renascer dói, lembra?


Mas a decisão foi fundamental. O apoio também.


Achar uma manicure para vir em casa foi fácil. Aprender a fazer unha amamentando, moleza.


Porque é fácil marcar a unha para a hora que o bebê está dormindo, não é mesmo? Nãaaaao!!!!


Às vezes você dorme, às vezes você chora, às vezes você mama. Às vezes fica no carrinho, às vezes no colo, às vezes no sling. Às vezes fica com o papai. Às vezes, com a vovó. A ajuda deles foi fundamental para isso.


Apoio.


Apoio ofertado, apoio aceito, com muito gosto e segurança, obrigada!


O apoio também foi ótimo para os banhos demorados. Demorados não. No tempo certo. Porque banho de 2 minutos de vez em quando até vai. Mas todo dia não dá! O corpo está exausto, lembra? A mente também.


E assim, aos trancos e barrancos, vou aprendendo a cuidar de nós dois ao mesmo tempo.


Veja só que loucura, meu filho. De nós dois!!! E ao mesmo tempo!!!


Há 32 anos eu tinha à minha disposição 24 horas por dia para cuidar de mim. E muitas vezes não dei conta. De repente, saio de casa às três da manhã, de mãos abanando, e volto no dia seguinte carregando um serzinho indefeso que precisa de atenção 24 horas por dia! As mesmas 24 horas que já não eram suficientes para mim. Pânico, terror e aflição.


E isso é só o começo.


Mas, de algum lugar, é preciso (re)começar. Eu comecei fazendo as unhas.


E graças a um bom acompanhamento médico, ao apoio do seu pai e da sua avó, e também com um pouco de sorte por você ser tão bonzinho, consegui aprender, até bem rápido, a valiosa lição de que, para cuidar bem de você, preciso, antes de tudo, estar bem cuidada também. O corpo e a alma.


Você não sabe disso ainda, Caetano, mas, quando a gente cresce, não tem mais ninguém pra cuidar da gente, que não a gente mesmo. Apoio tem. Mas o protagonismo passa a ser só nosso.


E é por isso que hoje eu faço as unhas. E, nesse tempo dedicado a mim, me reencontro com aquela mulher que, na verdade, não morreu. Apenas se transformou. Permanece ainda mais viva. Um pouco menos vaidosa. Mais feliz do que nunca. E se sentindo muito bem.


Mas lembre-se, Caetano. Não quer dizer que seja fácil. Não tem nada de simples no que acabo de te dizer. Quero apenas que você saiba que é possível e que, com o tempo necessário, tudo se ajeita.



      Flávia Vilhena
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Sou a Flávia. Mãe do Caetano e do Augusto. Viajante, ex-blogueira (de viagem), advogada e agora escritora...

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